Viagem...
“A verdadeira generosidade para com o futuro consiste em entregar tudo ao presente”
Albert Camus
... Utópico... Mas foi assim, desta forma, que comecei a pensar na viagem da minha vida. As malas estavam feitas, pouca coisa, próprio das mulheres...
Chegára finalmente o dia de partida e fui pensando em tudo o que deixaria para trás. Não queria que ninguém me acompanhasse ao aeroporto. Não gosto de despedidas. São como os presentes de Natal. Embaraçosas. Nunca sei o que dizer, nem o que fazer, nem onde colocar as mãos, nem se devo sorrir... E só me despeço quando alguém que amo, morre. Um doloroso adeus!!Queria ir embora olhando apenas para a frente. O meu tumulto e a minha crise espiritual não me permitiriam ser correcta com ninguém, a não ser comigo mesma.
Entrei no avião, olhei pela janela e, só aí, realmente, me apercebi que a partir daquele momento estaria... só!! Só eu, comigo mesma. Sabia que alguma coisa tinha mudado, portanto comecei a ouvir o meu coração de uma forma drástica.
A minha vida tornou-se tão mais simples e significativa quando abandonei a bagagem do meu passado. Iria reducar-me, aprender o valor dos momentos de instropecção e iria, com toda a certeza, parar de gastar tempo com prazeres mundanos e começar a desfrutar de pequenos deleites: ver as estrelas, olhar para dentro de mim, ouvir o mar, observar os outros e... aprender. Aprender a criar uma vida com mais equilíbrio e encanto...
Durante a viagem, depois de uma refeição que nunca chegou a ser, encostei a cabeça e questionei o “porquê” desta aventura. Tentei encontrar todos os motivos que me levaram até onde fui... e foram tantos meu Deus...
Queria sair dessa cidade, pequena, mesquinha, atrofiadora e abandonar os amigos fúteis, deprimentes, ébrios, ocos de sentido...
Queria saber o que está para além disso tudo. Serão as pessoas assim tão diferentes? Serão esses lugares assim tão misteriosos e apelativos?
Queria abandonar um amor na esperança de não o perder. Arriscar. Deixar um rasto de perfume, de carícias....e mesmo assim, partir!
Queria sol, luz...
E queria o quê mais?? Mais nada??
Houve uma razão que só descobri então... e foi tão forte, tão repentina que se impôs a todas as outras. E foi aí onde falhei.
Queria mostrar-te a ti, Pai, que sou corajosa o suficiente para vos abandonar hoje sem olhar para mais nada, que o desconhecido não me intimida, que já sou uma mulher e não a menina que se sentava no teu colo e pedia histórias, que não me amedrontam as pessoas diferentes, que sei viver com muito pouco, no caso, com quase nada, que sei o valor do trabalho e dos sacrifícios para o conseguir, que já reconheço o valor que davas ao “escuro”, queria que soubesses que a minha ingenuidade foi poderosamente derrotada por MIM e que me desenrasco sozinha sem conhecer as pessoas certas como tu conheces. Queria que sentisses orgulho em mim.
Vá lá, faz comparações agora!? Não me tornei em alguém melhor?
Claro que não, não é pai? Falhei. Só agora o sei porque na altura estava no auge da minha descoberta.
Deixei que sentisses a dor que sentia. Escrevi-te cartas com palavras que me denunciavam. Mostrei-te o mundo onde vivi e permiti que sentisses pena de mim. Não impedi as tuas lágrimas, aliás, provoquei-as. Precisei da tua ajuda uma vez mais. E culpei-me por sentir saudades do teu colo.
Falhei. É dado certo. Mas, sabes, a vida é feita de um leque de escolhas e o nosso destino desenrola-se conforme o caminho que percorremos. E, se não trouxe mais nada na bagagem, pelo menos aprendi que o fracasso, seja de natureza pessoal, profissional ou espiritual, é essencial para o desenvolvimento interior.Permite o crescimento e traz toda uma hoste de recompensas várias.
Não me arrependo do passado.
E deixei de negar o teu colo...
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