quinta-feira, janeiro 11, 2007

“Na minha cidade natal, Huambo, podia ouvir, nas noite de vento, o áspero rugido dos leões. Sempre que conto isto a amigos europeus eles ficam muito impressionados. Não lhes conto, é claro, que morava a quinhentos metros do Jardim Zoológico.
Entre a verdade e a mentira, o silêncio dá belas flores.”

Não sei quem escreveu. Esqueci-me de apontar. Mas sempre que leio este excerto lembro-me de mim. Quando fui viver para longe! Aos amigos dizia:
“Sabem, tenho uma casa fantástica, com vista para o mar. Toda ela viradinha para o mar.”
Depois concluí:
“Mas também, na ilha onde estou, toda a gente tem uma casa virada para o mar1”
No entanto, não o disse. Pensei apenas.

quarta-feira, janeiro 10, 2007

"Um Conselho Antes da Batalha"

"Ao fim e eo cabo, e com todo o progresso da ciência, o resultado depende cada vez mais do carácter do dirigente e do seu poder de resistir «às sensuais sensações do campo de batalha». Finalmente, para aqueles que se querem preperar de avanço para tal responsabilidade, não conheço conselho mais inspirado do que aquele que foi dado há séculos, por Krishna a Arjuna, quando este tremia perante a terrivel responsabilidade de lançar o seu exército contra as hostes de Pandav:


A vida que há em todas as coisas vivas, oh Principe ,
Está protegida de todo o perigo. Por isso, não sofras,
Por aquilo que não pode sofrer. Cumpre o teu papel!
Lembra-te do teu nome, e não temas.
Nada melhor pode acontecer a uma alma marcial
Que uma guerra legítima. Feliz o guerreiro
A quem vem a alegria da batalha...
...Mas se te afastas
Deste campo de honra - tu, um Kshittriya -
Se, conhecendo o teu dever e tarefa, deixares
O teu dever e a tarefa passar - isso será pecado!
E aqueles que hão-de vir falarão de ti com infâmia,
De geração em geração. Mas a infâmia é pior,
Para os homens de sangue nobre. é pior de sofrer que a morte!


Por isso ergue-te, tu Filho de Kunti! Endurece
O teu braço para o combate; prepara o coração para encarar
Como coisas semelhantes a ti, o prazer ou a dor,
O teu lucro ou a ruína, a vitória ou a derrota.
Assim mentalizado, ganha coragem para a luta, pois assim
Não pecarás!"

terça-feira, janeiro 09, 2007

Viagem...

“A verdadeira generosidade para com o futuro consiste em entregar tudo ao presente”
Albert Camus

... Utópico... Mas foi assim, desta forma, que comecei a pensar na viagem da minha vida. As malas estavam feitas, pouca coisa, próprio das mulheres...
Chegára finalmente o dia de partida e fui pensando em tudo o que deixaria para trás. Não queria que ninguém me acompanhasse ao aeroporto. Não gosto de despedidas. São como os presentes de Natal. Embaraçosas. Nunca sei o que dizer, nem o que fazer, nem onde colocar as mãos, nem se devo sorrir... E só me despeço quando alguém que amo, morre. Um doloroso adeus!!Queria ir embora olhando apenas para a frente. O meu tumulto e a minha crise espiritual não me permitiriam ser correcta com ninguém, a não ser comigo mesma.

Entrei no avião, olhei pela janela e, só aí, realmente, me apercebi que a partir daquele momento estaria... só!! Só eu, comigo mesma. Sabia que alguma coisa tinha mudado, portanto comecei a ouvir o meu coração de uma forma drástica.
A minha vida tornou-se tão mais simples e significativa quando abandonei a bagagem do meu passado. Iria reducar-me, aprender o valor dos momentos de instropecção e iria, com toda a certeza, parar de gastar tempo com prazeres mundanos e começar a desfrutar de pequenos deleites: ver as estrelas, olhar para dentro de mim, ouvir o mar, observar os outros e... aprender. Aprender a criar uma vida com mais equilíbrio e encanto...
Durante a viagem, depois de uma refeição que nunca chegou a ser, encostei a cabeça e questionei o “porquê” desta aventura. Tentei encontrar todos os motivos que me levaram até onde fui... e foram tantos meu Deus...
Queria sair dessa cidade, pequena, mesquinha, atrofiadora e abandonar os amigos fúteis, deprimentes, ébrios, ocos de sentido...
Queria saber o que está para além disso tudo. Serão as pessoas assim tão diferentes? Serão esses lugares assim tão misteriosos e apelativos?
Queria abandonar um amor na esperança de não o perder. Arriscar. Deixar um rasto de perfume, de carícias....e mesmo assim, partir!
Queria sol, luz...
E queria o quê mais?? Mais nada??
Houve uma razão que só descobri então... e foi tão forte, tão repentina que se impôs a todas as outras. E foi aí onde falhei.

Queria mostrar-te a ti, Pai, que sou corajosa o suficiente para vos abandonar hoje sem olhar para mais nada, que o desconhecido não me intimida, que já sou uma mulher e não a menina que se sentava no teu colo e pedia histórias, que não me amedrontam as pessoas diferentes, que sei viver com muito pouco, no caso, com quase nada, que sei o valor do trabalho e dos sacrifícios para o conseguir, que já reconheço o valor que davas ao “escuro”, queria que soubesses que a minha ingenuidade foi poderosamente derrotada por MIM e que me desenrasco sozinha sem conhecer as pessoas certas como tu conheces. Queria que sentisses orgulho em mim.
Vá lá, faz comparações agora!? Não me tornei em alguém melhor?
Claro que não, não é pai? Falhei. Só agora o sei porque na altura estava no auge da minha descoberta.
Deixei que sentisses a dor que sentia. Escrevi-te cartas com palavras que me denunciavam. Mostrei-te o mundo onde vivi e permiti que sentisses pena de mim. Não impedi as tuas lágrimas, aliás, provoquei-as. Precisei da tua ajuda uma vez mais. E culpei-me por sentir saudades do teu colo.
Falhei. É dado certo. Mas, sabes, a vida é feita de um leque de escolhas e o nosso destino desenrola-se conforme o caminho que percorremos. E, se não trouxe mais nada na bagagem, pelo menos aprendi que o fracasso, seja de natureza pessoal, profissional ou espiritual, é essencial para o desenvolvimento interior.Permite o crescimento e traz toda uma hoste de recompensas várias.

Não me arrependo do passado.

E deixei de negar o teu colo...

domingo, janeiro 07, 2007

Pensar / Falar / Escrever

...Ando cansada... e sem tempo para me dedicar àquilo que me dá mais prazer: escrever!!
Disse a alguém, um destes dias, que se pudesse comprava uma casa num sítio isolado, com vista exclusiva sobre o mar... seria uma casa praticamente sem paredes, toda ela feita de janelas para deixar entrar a luz natural... Teria igualmente um alprende com vista privilegiada. Aí, dominando o ambiente, apenas uma mesa e uma cadeira. Nada de especial, somente conforto. Quase sempre haveria música.
Todos os dias, mal acordasse, faria questão em sentar-me e ouvir silenciosamente o calmo barulho do mar e do vento... e aí sim, pegava no papel e na caneta e rabiscava até me doerem os dedos. Teria, certamente, o cenário perfeito, contudo, há em mim uma dificuldade inultrapassável no que se refere ao acto de “escrever”...
Pensar e falar e pensar e escrever são duas acções completamente distintas. Explico.
Muitas vezes ouve-se o comentário “falei sem pensar”. Não acredito nesta frase. Sinto antes que é uma forma de desculpa de algo que foi dito e que magoou ou foi incorrecto. Pensa-se sempre antes de proferir qualquer palavra. É um acto consciente embora veloz...
A questão é o acto de “pensar” de cada um de nós. Uns há que reflectem objectivamente, outros fazem-no de forma subjectiva. Há pessoas de “pensamento” rápido e espontâneo, outras cautelosas e recatadas. E tantas outras vezes se confunde o “falar sem pensar” com a sinceridade... Discordo uma vez mais. Sinceridade não é sinónimo de precipitação. Sinceridade é a ponderação do que é real, do que é verdadeiro, do que é correcto e isso, hoje em dia, requer muita reflexão e serenidade.
Pensar e escrever é, talvez, a minha maior frustração.
Tenho um caderno, tal como tu tens Aquiles, onde vou apontando os pensamentos que me vão ocorrendo inesperadamente... Carrego-o comigo para todo o lado porque me sinto despida sem ele! Mas o inevitável acontece com mais frequência do que eu o desejaria. Penso rapidamente e quando tento passar para o papel, já a minha história mental vai uns capítulos à frente... sinto que o meu acto físico de escrita não acompanha o meu acto mental. As palavras escondem-se, retraiem-se e ficam apenas no ar. Não pretendem ser lidas mas sim “pensadas”!
Às vezes, quando a noite já caminha para dia, dou por mim a reflectir sobre isto ou aquilo, com ou sem importância alguma. Sinto que o deveria “imortalizar” no bendito caderno mas, tantas vezes por preguiça, decido seguir o conselho sábio (e útil à minha sonolência) de um antigo professor do liceu... Diria ele que só aprendemos realmente alguma coisa quando a conseguimos repetir três vezes sem qualquer tipo de lacuna. É exactamente o que faço com os pensamenos nocturnos. Repito-os em silêncio. No entanto, durante o dia, sinto que se perdeu uma ou outra palavra que faria toda a diferença naquele texto. Não o faço com a convicção ideal, provavelmente.
Sendo assim, reconhecendo as minhas limitações, aprendendo a contornar os meus obstáculos e vivendo no ambiente perfeito, em plena comunhão com a natureza, sou bem capaz de afirmar que não sairia “literatura” das minhas mãos mas, com certeza, todos os meus textos seriam mais transparentes, explícitos e “directos”... da alma para o papel. Teria certamente a “liberdade” necessária para ser autenticamente momentânea e encontraria o veículo certo e adequado para o transporte das minhas palavras... Como uma fotografia do interior.

... até lá, vivo nesta correria quotidiana, observando, sem a devida atenção, absorvida pela mediocridade gratuita, sem conseguir descortinar a nitidez óbvia do que é comum, sem metáforas, sem subterfúgios... apenas a realidade!!