sábado, maio 12, 2007

Os meus pais...

Esta é a primeira vez que escrevo um texto deste género. Uma homenagem??
Nunca antes os meus textos tiveram apenas um destinatário... os meus pais!! No entanto, agora, partilho-o convosco...

Amo-os da mesma forma. Com a mesma intensidade, admiração e respeito... mas o meu pai marcou-me, e marca-me, de uma forma especial. É o meu exemplo máximo. Representa aquilo que eu quero ser quando for grande.
Quando olhamos para o meu pai vemos um homem sério, a barba branca, meticulosamente aparada, confere-lhe aquele ar autoritário que nunca perdeu... os olhos são pequenos, castanhos, mas expressivos. Sabia perfeitamente interpretar os seus olhares e todas as mensagens que passavam sem proferir uma única palavra: “estás definitivamente de castigo” (mais vezes do que desejei), “horas de deitar”, “já estudou?”, “esta miúda dá-me cabo dos nervos”... e lembro-me com bastante frequência da frase dita por ele infinitamente: “Devia dar-te os parabéns?! Não. Os resultados são teus, para o teu bem. Fico feliz.” Muitas vezes o achei injusto e mau porque sobre as minhas falhas e os meus erros conversávamos sempre... sobre os meus sucessos nem por isso!!
A minha mãe é muito bonita e fica toda contente quando vamos a alguma loja e, enquanto ela experimenta uma roupa lhe perguntam: “ Quer que vá chamar a sua irmã para dar a sua opinião?”; “É minha filha e sim, pode chamá-la se faz favor.” É vaidosa, herdei isso dela, e diz que nunca tem nada para vestir apesar de ter um casaco para cada dia do mês, se assim o entendesse.
É uma verdadeira dona de casa, uma excelente cozinheira (nunca hei-de saber fazer um arroz como o dela) e, apesar de não ser muito dada a expressar os seus sentimentos, era a primeira a sair do trabalho a correr quando nos acontecia alguma coisa. Nunca me contou histórias, como o pai, mas ensinou-me a ser mulher.

Quando era ainda pequenina tinha medo de ficar sozinha no quarto. A minha irmã, mais valente, ficava sempre na sua cama em dias calmos ou de tempestade. Eu não. Nos dias de trovoada (ainda hoje fico nervosa), nas noites dos pesadelos, nas insónias, lá ía eu, de almofada em punho para a cama dos meus pais. O meu pai abraçava-me, contava-me uma história ao ouvido, adormecia e no dia seguinte acordava sempre na minha cama...
Enquanto adolescente dei-lhe algumas dores de cabeça. Nada de grave, sei-o hoje. Coisas de miúda que, sendo a mais nova, se queria impôr, redefinir e questionar regras antigas, galgar terreno nunca antes conquistado. Como me custou caro esta atitude, às vezes. “Esta miúda vai ser comunista”, brincava o pai... Era boa aluna apesar de não me dedicar como ele gostaria.
(fim do 2º Período Lectivo)
- Pai, hoje tenho treino.
- E?
- Levas-me?
- Qual foi a tua nota a Matemática?
- Mas às outras disciplinas tive 4s e 5s.
- Perguntei: qual foi a tua nota a Matemática.
- 2.
- Não preciso de dizer mais nada, pois não?
- Mas...
- Já devias saber distinguir um Não. (Com aquele ar impávido e sereno. Não valia a pena tentar mais. Era irredutível)
O meu treinador elogiava-me a velocidade de passe, a força, a garra... porém, uma boa andebolista, na opinião do pai, tem de ser boa aluna a Matemática. Esta disciplina destruiu a minha carreira desportista...
Saídas à noite. Pesadelo. Cheguei a escapar-me pela varanda do meu quarto à sucapa... (esqueci-me que ele vai ler isto). As minhas colegas saíam todas, encontravam-se com os rapazes, davam uns beijitos e eu em casa a olhar para a televisão!!??
- Pai, posso sair logo à noite?
- Vai falar com a tua mãe.
- Mãe, posso sair logo à noite?
- Vai falar com o teu pai.
- Posso decidir eu então?
(Nunca resultava!!) Era o jogo do empurra. Nem a minha irmã se chegava à frente. Raios!! Eu não queria propriamente estar colada a ela. Era só para o disfarce caramba!! Mas a minha irmã não ía em cantigas. Sabia que eu não era de confiar. As duas de manhã dela eram as minhas quatro!!
Resultado: varanda. Nunca fui apanhada. E feliz ficou o meu cão “Sebastião” com as bolachinhas extra. No íntimo ele adorava e ansiava pelas noites de sábado.

Hoje, já adulta, reconheço-lhes todas estas precauções e cuidados. Creio que, quando tiver um filho não mudarei muito a educação e as regras que me foram impostas. Cresci feliz, realizada e sei que a pessoa que sou hoje é exclusivamente mérito deles. Prezo todos os valores que me foram incutidos: o respeito pela diferença, a honestidade, a responsabilidade, o poder do sonho e das palavras, o saber chorar, o significado da palavra “ajudar”, os amigos...
- Estás a mentir.
- Não estou.
- Estás.
- Não estou.
- Se disseres a verdade eu vou ficar feliz...
- Pai, menti...
Apesar de abominar a palavra “mentira”, o meu pai nunca me castigou quando, finalmente, contava a verdade. E isso ensinou-me que dá trabalho mentir. É bem mais fácil dizer a verdade de uma vez por todas...

Há uma altura das nossas vidas que os papéis, inevitavelmente, se invertem. Antigamente cuidavam de mim, vigiavam-me os passos, preocupavam-se se comia, se dormia bem, ficavam doentes se me sentia menos bem... Hoje, assumo na plenitude o papel outrora protagonizado por eles. Vejo-os e sinto-os a envelhecer. E o meu coração envia-me sinais de aviso. Agora, o tempo, pode ser quase contabilizado e não consigo passar um dia sem lhes dizer: “Adoro-vos”...

E aquela música que a mãe nos ensinou...

“Quero levar-te para longe
a um lugar
Onde nunca na vida
Pensaste chegar
Construir um abrigo
Onde estejas comigo
E o teu nome ao vento
Bem alto
Gritar!
...”

2 comentários:

Anónimo disse...

Fico muito feliz em saber que a maioria dos pais ( e refiro-me ao homem)é pai com P grande...Eu tento ser :D não que tenha tido um bom exemplo.
Já as mães são sempre fulcrais

Bom texto

ÞrincessFaßiana disse...

Adorei Selene ... fantástico :)
Um bjo Fabi ***